Desculpe o transtorno, mas preciso falar sobre o feminismo
Conheci ele na faculdade. Essa frase pode parecer comum em tempos de escola sem partido, mas eu não tive feminismo como disciplina na minha grade curricular de filosofia, fui conhecê-lo através de grupos de estudo organizado por estudantes autônomas. Eu havia ouvido falar antes dele, só que tudo o que chegava até a mim sobre feminismo eram distorções de pessoas mal informadas ou mal-intencionadas sobre o assunto. Logo a imagem que eu tinha dele, era completamente diferente daquilo que eu fui conhecer depois.
Quando fui ler sobre o que se tratava foi uma ótima surpresa. O feminismo não defendia a supremacia feminina, como alguns vivem dizendo. O feminismo defende a equidade entre os gêneros. E mais, descobri vertentes que abrangiam as perspectivas de todas as mulheres: negras, brancas, liberais, marxistas, queer, trans, radicais, enfim, contemplava todas as mulheres com suas vivências. Foi paixão à segunda vista. Entre nós dois, tenho certeza.
Passei muitas e muitas horas me reconhecendo através dele, ao som de Nina Simone e Beyoncé. De lá para cá, li: Beauvoir; Saffioti; bell hooks; Butler; entre outras tantas maravilhosas.
Tudo isso começou quando o feminismo tinha pouco mais de um século e eu 28 anos, mas parecia que a vida começava ali. Assistimos muitas séries do Netflix juntos. Algumas várias vezes, como Orange is the New Black que eu chorei no final da última temporada.
Aprendi que não era errado eu não saber fazer nenhuma receita de risoto. E que queimar panelas é não é nenhum crime, afinal as vezes tem coisa mais interessantes pra se fazer. Passei a escrever em meus textos a palavra humanidade, ao invés de homens quando me referia aos seres humanos em geral. Através do feminismo fiz muitas amigas novas e junto com elas fiz eventos, comunicações, cursos, tardes de leitura, discutimos e fomos ao bar.
Sofremos com os haters, os machistas e os misóginos, mas ganhamos muito mais força com as minas e as manas que conhecemos no caminho. Dos dez artistas que eu curtia descobri que sete eram machistas e que 3 eram misóginos, então eu mudei. Passei a querer não apenas uma performance bem-feita, ou um rosto bonito, passei a exigir que meus ídolos e minhas divas também me respeitassem enquanto ser humana.
Com o feminismo aprendi o que era cisgênero, gaslighting, heteronormatividade, mansplaining e outras palavras que o Word tá sublinhando de vermelho porque o Word é um sistema criado dentro do patriarcado.
E assim continuamos. E não, não é fácil. Choramos muitas vezes com as notícias de feminicídios, os retrocessos, e as misoginias sofridas no dia-a-dia; e rimos, nos construímos, nos desconstruímos, e nos reinventamos a cada nova experiência ou informação. Não é fácil ser mulher: quando se está solteira nos perguntam quando seremos casadas; quando estamos casadas querem saber quando seremos mães; quando somos mães nos perguntam quando nascerá o próximo filho… É uma sequência de cobranças infinitas que geralmente servem para nos limitar sobre aquilo que queremos e aquilo que a sociedade acha que devemos querer para a nossa vida.
Essa semana, mais uma vez, um homem famoso publicou num jornal de circulação. Até ai normal. Porém, dessa vez tratava-se de uma espécie de carta de amor para a ex-namorada também famosa. Como sempre, por ser homem, todo mundo achou bonitinho, fofo, lindo, chorou, e tudo mais. E nós, eu e o feminismo, só ficamos pensando: e se fosse uma mulher publicando uma carta de amor para o ex-namorado dizendo que lamentava não ter engravidado dele, será que ia ter toda essa aceitação massiva da carta, ou será que ela seria chamada de recalcada, desesperada, histérica, aproveitadora, golpista que queria ser sustentada pela pensão alimentícia?
E ao que parece, a resposta dessa hipótese não saberemos. Então só me resta seguir questionando. Já que foi assim que aprendi com o feminismo, porque ao contrário do patriarcado que está muito bem alicerçado e satisfeito, para nós as feministas ainda tem muita luta. Avante!
Por Renata Floriano
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