Notas sobre a falsa polêmica do turbante
1. Apropriação cultural não é sobre uso de um adereço ou sobre comer sushi. Apropriação cultural é sobre sistema estrutural politico-econômico;
2. Qualquer pessoa seja de religião de matriz africana, de onde, no Brasil, se referencia o uso do turbante, seja africana, sabe das origens do símbolo;
3. Processo de assimilação que ocorre na apropriação, que eu repito que envolve SISTEMA, ECONOMIA E POLÍTICA, portanto estrutura, é diferente de processos de troca, mesmo que com certas tensões, entre povos e etnias. É sabido da relação, muito anterior a exploração européia, que povos árabes-persas estabeleceram com povos africanos. Afinal, islamismo existe em África. Judaísmo também. É muito anterior ao que qualquer cabeça branca eurocêntrica pode imaginar. Até chineses já estabeleciam relações com povos africanos antes da barbárie de exploração européia no continente. Os turbantes vão se reconfigurar neste processo. O turbante persa-árabe tem uma simbologia. O turbante indiano, outra. Jeitos diversos de amarração, inclusive, diante dos simbolismos que carregam. Assim como o turbante africano. Todos de um mesmo tronco (como dizemos na Letras) cultural, mas com ramificações diversas. Nenhum africano ressignificou turbante pra explorar e ganhar dinheiro com ele. Segue, inclusive, no tronco cultural-religioso. Há, inclusive, celebrações islâmicas totalmente diferentes em África, dado o diálogo com as religiões das etnias africanas ali presentes;
4. A referência no Brasil, repito, do uso do símbolo é da cultura negra e não da indiana ou persa. Portanto, quando se fala em turbante no Brasil, está se falando da cultura negra;
5. Portanto, me parece mais um sinal de má fé e desonestidade intelectual tentar criar neblina no assunto. Branco sempre usou o que quis. Inclusive, esvaziando e apagando símbolos culturais de diversas etnias mundo afora. Nunca na perspectiva de troca e diálogo, mas sempre na perspectiva da dominação. Ou vocês vão vir negar história? A discussão não é sobre usar ou não turbante. Comer ou não sushi. Isso é levar a discussão na leviandade. A questão é um sistema de dominação ESTRUTURAL que apaga histórias e que, ao mesmo tempo que reproduz este apagamento e se utiliza destes símbolos, violenta e mata os povos que originaram ou utilizam-se deles como eixos de suas culturas. Ou seja, da coisa SÓ ser aceita quando brancos a utilizam. Isso é sistema de supremacia branca. Isso é dominação.
Há elementos mais importantes a serem discutidos do que o turbante.
Tem que parar de ser desonesto. Tem que ir ler o que as pessoas produzem sobre isso. Não é debate baseado em achismo. Ou poderei afirmar, como dizia Malcolm X, diante de contradições e provocações para que brancos se posicionassem, que você é sim racista.
Por Juliana Borges
Imagem destacada: Vogue Itália
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