Passos que vêm de longe e vão longe

A quarta-feira amanheceu preguiçosa, dessas manhãs de inverno em que o corpo reluta para sair da cama. Mas o dia era especial, então foi correr para se arrumar, pegar o busão e ir pra UNESP para assistir a apresentação da dissertação de mestrado sobre arte educação de uma amiga muito especial.

Quando cheguei já havia muita gente preta na sala. Ela havia acabado de começar sua defesa, na qual honrava suas mais velhas e as agradecia por terem aberto caminhos. Ela começou a explanação de sua pesquisa, embasou suas escolhas teóricas, bibliográficas e esmiuçou suas vivências. A mulher não falava só do que tinha lido dos livros, mas muito do que tinha vivenciado na prática, na lida, no tête-à-tête.

Aos poucos a sala foi ficando cheia, chegou gente nova, gente velha, até criança, todo mundo foi ver a menina brilhar… na frente da moça havia três pessoas anotando o que ela falava e, no final, essas pessoas falaram.

O primeiro a falar foi um homem de cor retinta, roupa vermelha e tranças nos cabelos. Este homem comparou o trabalho da moça com música, disse que era harmônico, tinha ritmo e compasso como a música do Tiganá Santana. As outras duas pessoas a falar, além demonstrarem estar impressionadas com a apresentação, também demonstraram choque. Choque com uma sala cheia de gente, cheia de gente preta. Uma delas, de voz nordestina, elogiou muito o trabalho e disse que a moça tinha que sair pelo Brasil e o mundo polinizando suas descobertas. Depois enfatizou a importância e responsabilidade de uma mulher negra protagonizar estes feitos, disse que logo ela seria uma referência, dessas que a gente busca nos livros para embasar nossas descobertas. Por fim, a última mulher, tinha a voz embargada, se emocionou e agradeceu, ela estava sem palavras.

Mestre Juliana dos Santos

Diz que na tradição da academia, as pessoas precisam sair da sala para os avaliadores decidirem o veredito, e já que é tradição, o povo saiu rápido e, lá fora, era só abraço, olho no olho e orgulho saindo pelos poros.

Passou um tempo e todos foram convidados para voltar até a senhora de 93 anos que pisava pela primeira vez em uma universidade. Aquela senhora de cabelos brancos, pisada leve e serenidade no sorriso e carinhos de avó.

A mulher que conduzia a sessão pediu para que todos ficassem em pé para ouvir a decisão.

Um silêncio tomou conta da sala, daqueles silêncios que permitem ouvir o coração bater. E a mulher disse que o trabalho era tão bom, mas tão bom, que tinha que virar livro, publicação. Ah menina! Foi aí que as lágrimas que estavam tentando se esconder pularam para fora dos olhos, e que as palmas, como tambores animados, tocaram, e que os abraços quentinhos foram distribuídos.

Assim termina e inicia a jornada da moça pautada na correria e sustentada por seus pares. Estes passos vêm de longe, e ainda vão muito adiante. Essa menina, mulher moça é Juliana Dos Santos, anotem este nome! Obrigada Ju, por ter sido generosidade, dedicação e abundância conosco que acompanhamos sua jornada.

Por Priscila Fonseca
Imagens: acervo pessoal da autora.
Na foto em destaque, Priscila cercada da Mestra Juliana Dos Santos e sua avó

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