Quando entendi o racismo
Fui criada por pais extremamente esclarecidos, cultos. Pessoas com noções amplas e claras sobre preconceito, política e justiça. Eles nos passaram estas noções e valores. Nossa criação classe média baixa, incluiu morar perto de comunidades, colégio público (o maior do nosso estado), amigos negros e zero segregação. Pelo menos em nossa casa.
Eu sempre desprezei o racismo e os que o propagavam. Era doloroso estudar, ver filmes, ler a história cruel da raça. Mas eu li, me interessei. Porque é preciso mais do que simplesmente “não ser racista” para entender toda a problemática intrínseca em anos de segregação racial e social.
Apesar disto, houve um fato que elucidou tudo como um tapa na cara. Na minha cara. E um tapa doloroso.
Meu namorado é o que muitos chamam de “mulato” ou “pardo”; sua pele é branca, mas seus traços e cabelos claramente de negro. Eu, branca. Simples assim.
Foram muitas as vezes que passei por um viaduto perto da minha casa, dirigindo, e lá todas as noites tinha blitzes. As vezes havia bebido (não me orgulho), outras estava sem o documento do carro que havia sido roubado. Mas eu nunca fui sequer parada. Nunca.
Um dia, voltávamos do trabalho dele, no meu carro, em direção ao supermercado – aquela vida cotidiana de segunda-feira – e ele estava dirigindo. Só haviam parado motociclistas. Fomos parados. Eu ainda estava sem o documento do carro, mas com um BO declarando ter perdido ele para um furto. Quase não houve conversa. Foram 15 minutos tensos, com ele argumentando educadamente e sendo calado. Eles queriam apreender meu carro (que é o procedimento correto, não estou discutindo isto). Até que um policial, após um pedido meu, decidiu verificar a placa do carro pelo rádio e nos liberou.
Pode não parecer nada, mas pra mim foi tudo. Tudo o que eu não havia entendido antes.
Sobre todas as coisas que eu li e ouvi. Foi quando eu entendi o racismo.
Passei horas no supermercado falando, indagando, me enfurecendo.
Nunca mais eu vi as coisas da mesma maneira. Nunca mais verei.
Agradeço por isto.
Agradeço pelos textos de mulheres incríveis sobre o assunto que dia a dia tem me aberto mais a visão. Sou sim privilegiada. E, neste sentido, odeio isto.
Não posso falar sobre assuntos que não vivi, não sofri. Porém, nestes casos tenho usado a empatia para entender e meu bom senso para mudar o que estiver ao meu alcance.
E eu, espero, honestamente e fervorosamente, que as coisas mudem. E que seja hoje. Pelo menos um pouco.
Tentarei, mais um dia, fazer minha parte.
Por Caroline Fernandes
Imagem destacada: via zh.clicrbs.com.br
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