Assim eu quero meu 8 de Março.
Escrevendo e deletando mentalmente um texto, me perdi na madrugada e fui interrompida pelo estampido: um tapa de um homem numa mulher, perto da minha casa.
Aquilo que era poema, secou. Nenhuma rima, nenhum verso transbordará dos meus dedos, hoje. As palavras que restam coloco aqui.
Assim começo meu 8 de Março: acordada por um tapa desferido no rosto de uma mulher. Poderia ser no meu.
Eu sinto a dor na minha bochecha e estampa na minha pele a impotência e a humilhação. Tenho convicção que minha irmã é capaz de sentir isso, minha mãe, primas e amigas, também. Todas as mulheres sentiriam, porque naqueles 15 segundos não foram elas.
Eu não espero que os homens estejam neste lado, o da cabeça baixa que leva as mãos no rosto para cobrir a história, que já nem é de dor. Eu não espero que sintam, verdadeiramente, o que é estar nesta posição. Eles estão na frente, de mão erguida. E é assim mesmo que quero que você, homem, me olhe: numa cena eternizada e sob efeitos, em que o entorno gira frenético mas nós estamos ali, imóveis, paralisados diante das nossas circunstâncias.
O que temes, homem? Que eu saia da posição de objeto secularizada em que estou? Não temas, isso não é rápido, toma tempo e custa vidas. Mas vai acontecer. Que lugar seria este? Confesso, não sei, ao certo, ainda.
Porque te colocas tão longe nesta posição de violência podendo ocupar outras? É o meu meu corpo livre que te amedronta? Enquanto teu gozo se expressa no desfalecimento e o meu, no infinito? Enquanto tu murchas e eu encharco. É aí que nos afastamos e tu te apequenas?
Porque te reduzes a esta covardia? Seria quando proclamas teus instintos ignorando os meus? Os ditos instintos masculinos ancorados, na realidade, numa cultura de dominação e violência contra mulheres enquanto os meus, geração de vida, são historicamente amordaçados sob acusação de bruxaria? A pachamama nos habita, homem. Mas não é para te diminuir, é para crescer!
Olha pra mim, nós estamos em guerra. Mas vocês está ganhando e eu, morrendo. A cada 15 segundos uma de nós morre, por dentro. É esta vitória que tanto treinas nos jogos bélicos de menino? É por isso que te convertes neste homem, de mão erguida na minha frente?
A guerra é dos homens contra as mulheres, esta é a verdade. Não é pelo fato de tu nunca teres agredido fisicamente uma mulher que milhares de outros não o tenham feito cotidianamente. Embora não estejamos nas capas dos jornais sob a manchete “crise da segurança”, nós somos os fatos e dados da violência (de gênero) no país, também conhecida pela violência dos homens contra as mulheres. Isto é real.
Agora me olha de novo, nós estamos naquela cena eternizada, abaixa a mão.
Imagina um abraço.
Assim eu quero meu 8 de março.
Por Marta Dueñas
Imagem destacada: Schiele Egon The Embrace Man and Woman
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