Querem silenciar as mulheres. Nós vamos paralisar.
Alguns dos principais coletivos feministas do mundo estão convocando uma paralisação geral para o dia 8 de março de 2017, algo parecido com que as islandesas fizeram em 1975, e que resultou em uma adesão de 90% da população feminina daquele país. Hoje em dia, apesar de menos de 20% dos cargos políticos serem ocupados por mulheres na Islândia, elas conseguiram alguns direitos fundamentais. É lei no país a igualdade salarial. Nenhuma mulher pode ganhar menos que um homem ao exercer a mesma função, com as mesmas qualificações.
Para isso, foi preciso uma grande dose de sacrifício pessoal? Na verdade, muito provavelmente não. Na época, já existia uma consciência na população islandesa de que as mulheres, provavelmente, tinham as mesmas capacidades intelectuais e laborais dos homens. Eu digo provavelmente, porque as islandesas relataram, após o dia de greve, que alguns homens riram um pouco da ideia de uma paralisação. O que NÃO houve foram casos de violência doméstica contra mulheres que aderiram à paralisação. O que houve, e muito, fora casos onde a população podia ouvir, durante uma transmissâo de rádio ou de TV, o barulho de crianças brincando ao fundo, porque os pais ou cuidadores masculinos tiveram que as levar para o trabalho. O que houve foram homens se virando e realmente reconhecendo o trabalho que as mulheres fazem em muitos, muitos setores, não só nos cuidados dos filhos ou da lida da casa.
Precisamos de uma paralisação amanhã porque, 40 anos depois desse episódio, há mulheres que não poderão parar de trabalhar, sob o risco de morrer nas mãos de um companheiro que quer o jantar. O risco é real. Já houve um caso recente no Brasil, em pleno 2017.
Há uma região na Índia agora mesmo onde os homens estão preparando greves para que o governo nacional não obrigue a localidade a cumprir a lei que exige ao menos 20% de participação feminina na política local, alegando que as mulheres só servem para a lida da casa e que isso é o patrimônio cultural deles.
Precisamos paralisar porque uma livraria conhecida no Brasil dará descontos de até 50% para mulheres em homenagem ao seu dia – mas só se forem livros de receitas, de autoajuda e de romances, o desconto não é válido para livros sobre ciências de qualquer espécie.
Precisamos paralisar porque estão matando pessoas nascidas com aparelho reprodutor feminino por acreditarem que elas são inferiores, e que são objetos a ser manipulados ao bem prazer dos homens, servindo-os. Precisamos paralisar porque o sistema patriarcal não aceita a nossa humanidade. Humanos são só os homens. Nós seríamos as loucas, as desequilibradas emocionalmente, as briguentas, as competitivas, as que não sabem manter amizade, as ciumentas. Precisamos paralisar porque a violência masculina é o pior problema do mundo no momento. Tem milhares de pessoas morrendo de fome no planeta, os recursos estão escasseando, a temperatura aumentando… e os homens conseguem superar tudo isso, de acordo com relatório recente da ONU.
Precisamos paralisar, ou aderir a algum ato por uma ou duas horas, ou deixar o trabalho doméstico para os outros no dia 8 de março de 2017 por todas as que não podem. Por todas as que não querem porque acham que a gente já conseguiu a nossa liberdade. Por todas as que se sentem cansadas demais, exaustas demais para achar que vão fazer algum diferença. O movimento feminista é um movimento coletivo. É por todas as mulheres. Não é só por uma classe ou por uma cor. Não importa a nossa classe social, não importa a nossa cor ou a nossa orientação sexual. Nós já somos uma classe oprimida independente disso. Basta ter nascido com vagina, útero, dutos mamários, e ser considerada uma mulher ao nascer. Quando lutarmos nesse dia, lutaremos por todas. Nem uma a menos!
Por Andreia Nobre
Imagem destacada: arte sobre foto de Olafur K. Magnusson da greve geral de mulheres na Islândia, via BBC Brasil
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