O machismo latente da sociedade brasileira

Após apenas duas semanas de governo, o presidente interino Michel Temer acusa o povo brasileiro de estar fazendo pressão psicológica nele. A organizações Globo fazem uma reportagem comovente, mostrando o desespero de Marcela Temer, que teria telefonado “aos prantos” para o marido em Brasília, temerosa de uma invasão de manifestantes em sua casa, em São Paulo.

O que a grande mídia nos mostra é o machismo latente da sociedade brasileira.

A revista Isto É fez uma reportagem com chamada de capa inteira, onde mostra uma foto da presidenta afastada Dilma Rousseff com aparente cara de enfurecida, com a legenda “Dilma perde o controle”. Rousseff é chamada de histérica, é acusada abertamente de estar perdendo as estribeiras com o seu possível impeachment, jogando papeis de mesas e agredindo Maria do Rosário.

A mátéria da Isto É era totalmente falsa. Não só a cena de fúria da presidenta afastada não aconteceu – Maria do Rosário desmentiu tudo em seu perfil do Facebook – como a foto de capa era, na verdade, um recorte de uma imagem de Dilma comemorando um gol da seleção brasileira, e não tinha nada a ver com um ataque de nervos dentro do Planalto. Tudo para dizer que Dilma – e todas as mulheres, por tabela – são histéricas, descontroladas e incapazes de discernimento. Quanto mais governar um país.

Mas Temer, conforme revela a Globo esta semana, realmente deu um tapa em uma mesa e gritou: “Eu sei governar, já lidei com bandidos antes”. Mas ele não é chamado de histérico. Um homem no poder pode mostrar fúria. Pode dar um tapa numa mesa com raiva e todos à sua volta dizem: nossa, coitadinho. Ele ficou zangado. Pra ele chegar a esse ponto, fizeram algo muito ruim com ele.

Enquanto isso, silêncio absoluto quanto a um estádio inteiro mandar a presidenta eleita do país, tomar na tarraqueta. Absolutamente merecido a governante do país ser alvo de adesivo colado no carro, simulando um estupro quando o cano de abastecimento é posicionado no veículo.

Mas é claro, as críticas são apenas para Dilma. Citando, mais uma vez, Simone de Beauvoir, “o opressor não seria tão poderoso se não tivesse aliados entre os oprimidos”.

Por isso, vemos Marcela Temer transformada em uma figura frágil, ilustrando qual deve ser o comportamento das mulheres, que devem ser protegidas das maldades do mundo, belas, recatadas, do lar e submissas. Ela chora, aflita, com medo dos manifestantes, pois é a donzela em perigo.

A presidenta afastada, no entanto, foi obrigada a aguentar por seis anos pressões, insultos e todo tipo de achincalhamento que nem o presidente interino aguentou após uma semana de governo. E não tem ninguém a quem telefonar. Não há nenhum príncipe encantado para a protegê-la. O consolo é que ela não precisa de um.

Este é um governo “dois pesos, duas medidas”? Não. Este é um governo hipócrita, misógino e corrupto.

O jornal Folha começou a semana jogando no ventilador áudios onde é revelado um esquema – chamado de “pacto nacional” – para barrar as investigações da Lava Jato e tirar a presidenta Dilma do poder porque “ela é jogo duro”. Porque ela não negocia.

Agora todos sabem que esse governo interino, que age desde o primeiro dia como se fosse permanente, somente chegou ao poder para salvar políticos investigados. É o a maior surrealpolitik dos últimos tempos e ainda há uma massa enorme de pessoas acreditando que não há coisa melhor no mundo do que ver políticos falando com português correto.

Quebrar o país, aprovar um déficit de 170 bilhões, alterando a meta fiscal e aumentando as despesas – que é o principal argumento do impeachment de Dilma, ou seja, o não cumprimento da meta fiscal – está tudo bem, conquanto que quem o faz entenda de mesóclise.

Por Andreia Nobre

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