Reflexões da votação do impedimento
A votação ainda não terminou, mas eu confesso a vocês que só não estou chorando de teimosa que eu sou. Tenho vontade de chorar especialmente por saber que, dentre todos os milhões de brasileiros que estão assistindo inconformados a este circo pela TV Câmara, eu ainda pertenço ao grupo que está mais ou menos no lucro. Há quem tenha muito mais motivos, e motivos muito piores pra isso.
Eu nasci em 1992 e, desde que tenho noção de sociedade, nunca vi nada parecido com o que está se passando hoje. Não tinha verdadeiras esperanças de que a votação corresse de outra forma. Mas não tinha como estar pronta para o tapa na cara que 500 anos de genocídio, escravidão, nobiliarquia e promiscuidade política estão nos dando em forma de ignorância. Temos um Congresso com mais 200 analfabetos políticos que estão comprometendo ainda mais a nossa estabilidade em nome de Deus, dos netos, da 4ª geração anterior da sua família e do seu time de futebol.
Somos uma população capaz de eleger esses sujeitos. Somos uma população que não conhece a si mesma, à própria história e Constituição, que não sabe como o próprio governo funciona, que não tem interesse em saber. Honramos, ainda, a pecha de “povo cordial” – um povo movido muito menos pela razão e pelo bom senso do que pela paixão, e, principalmente, pelo ódio a tudo que rasteja, tudo que foi colocado abaixo de nós (seja lá quem seja essa coletividade).
Desde a metade do ano passado, vinha considerando a ideia de fazer um mestrado e falar meia dúzia de coisas sobre comunicação e gênero a quem quisesse me ouvir. Eu agora olho para a TV e me pergunto: para quem eu falaria, afinal? O quanto nós falamos, e o quanto nós apenas pensamos falar? O quanto – e o que – nós não estamos ouvindo?
Aliás: teríamos nós uma lição ou duas a aprender sobre comunicação com quem estamos combatendo tão energicamente? Com toda a humildade que a minha vivência me exige, o que eu geralmente enxergo hoje são militâncias tão calcadas em desinformação, paixão e microfascismo quanto alguns grupos conservadores, com a desvantagem de ainda estar aprendendo a mobilizar pessoas “leigas” de forma expressiva. Se um dos nossos cânceres é a educação, estamos devidamente atentos a isso? Estamos prontos para reconhecer que temos um problema universal em termos de diálogo, posto que viemos todos do mesmo lugar? Estamos empenhados em criar as condições para um debate político sério que, se não poderá nos evitar um impeachment injusto, pode nos guardar de ainda mais violência bruta e retrocesso nos direitos humanos fundamentais?
A propósito: há tanta coisa tão errada acontecendo do meu lado que a ameaça do Estado Islâmico confirmada pela ABIN nessa semana ecoa muito distante na minha cabeça. Eu não sei nem o que me aguarda semana que vem; o que as Olimpíadas reservam pra nós? Alguém – especialmente aqueles que ansiavam pela aprovação do processo – consegue imaginar o país a médio prazo? Alguém sabe como estudar, trabalhar, funcionar normalmente daqui em diante, se já não estava nem um pouco fácil? Alguém sabe o que dizer?
Por Stefanie Cirne
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