Sobre ser a única negra no rolê e estafa emocional
Ontem de manhã, enquanto eu corria pra fila do ônibus pro trabalho, meus olhos contaram rapidamente 7 garis trabalhando na praça. Não lembro quantos homens e quantas mulheres, mas lembro exatamente da cor de todos eles. Todos negros.
Se eu pensar exclusivamente nos ambientes em que circulo, seja por trabalho ou lazer, a conta, por dia, de convivência com outros negros quase nunca chega naqueles mesmos 7.
Me entender como exceção entre negros e brancos, me fez entender também rapidamente o sentido de privilégio e a necessidade de sempre traçar o seguinte paralelo no meu dia a dia: privilégio x exceção. E nesse entendimento, nada poderia fazer mais sentido do que a ânsia por enegrecer espaços hegemonicamente brancos.
A dedicação às causas e estudos sobre a negritude e o feminismo negro – e aqui, sim, rodeada de um número maior de pretos – me fez aprender mais sobre os meus (e sigo aprendendo), mas também me mostrou que pode ser muito doloroso. E é.
Entendi que de tempos em tempos a minha saúde emocional se cansa e as palavras, as ideias, os argumentos viram uma coisa só: lágrimas. As vezes dura horas, as vezes dura dias.
Viver em ambientes prioritariamente brancos é se ver constantemente situando os outros em como tem coisa errada, e dói ver as pessoas achando que “tá tudo bem”, que não precisa falar. O preto não tá no convívio, no conceito de beleza, na bandeira e nem no arco-íris de muita gente.
Ao passo que a surdez também vira uma questão de sobrevivência. Por vezes a gente finge que não ouve algumas brincadeiras e pensamentos racistas tão naturalizados, pra não virar a chata do rolê e pro buraco da solidão não ficar ainda mais fundo.
Essa semana não foi fácil.
Mas acredito no poder do “novo dia” (obrigada, Miss Simone) e muito, muito mais no poder dos pretinhos. Isso me mantém. Porque a verdade é que eu não preferia estar em nenhum outro lugar. Prefiro que mais negros estejam nele.
“Por medo de incomodar, a gente cala as justiças. Mas dá pra promover mudanças no conforto?
Assumimos, então, que trazemos narrativas de incômodo.
Queremos que nossas palavras cortem como navalha a sua indiferença. Deixe a sua consciência intranquila, cause conflitos e tempestades.
Eparrei!”
Trecho de “Manifesto/ Pule, garota” – Rimas & Melodias. Assista:
Por Poliana Corrêa
Imagem destacada: forthdistrict.com
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