Socialização e feminismo
Sobre o conceito de SOCIALIZAÇÃO e o significado errôneo que lhe é atribuído dentro do feminismo:
Inicialmente, gostaria de endossar que é um conceito extremamente amplo que cabe diversas interpretações. Dentro dos estudos sociológicos, socialização é um termo que carrega contradições. Mas é importante falar sobre o processo de socialização com responsabilidade e fora do campo dos achismos.
O processo de socialização inicia-se na infância. Margaret Mead, uma moça que dedicou-se aos estudos antropólogos culturalistas (ela fez uns ótimos estudos sobre ritos de iniciação e socialização em diferentes culturas), reforçou a ideia de que o processo de socialização se divide em dois: de um lado, a socialização primária, própria à infância e graças a qual um indivíduo se torna um membro da sociedade, e de outro lado, um conjunto ininterrupto de socializações secundárias, pelas quais os indivíduos de todas as idades e de sociedades complexas e altamente diferenciadas interiorizam papéis, normas e representações diversas que lhes permitem autonomia sobre suas identidades.
Ok até aqui?
Sigamos.
Dentro da socialização primária proposta por Mead, tem uma coisinha chamada apropriação subjetiva. Isso é basicamente quando o indivíduo reconhece e identifica os papéis sociais e aprende a desempenhá-los de modo pessoal. Então, os estudos de Mead nos deixa bem explícito que o processo de socialização é pautado pela intersubjetividade e intercompreensão. Durkheim, apesar de ter uma visão mais determinista da coisa e acreditar que a influência exterior prevaleça, integra-se com a abordagem subjetiva de Mead (Habermas mais tarde reforça e aprofunda essa integração).
Aí a gente entra numa coisa chamada habitus. Habitus, para Bordieu, é “um conjunto de disposições, de maneiras de pensar, de sentir, de se comportar, socialmente constituído e incorporado pelos indivíduos”. É no habitus que encontramos a socialização de gênero, inclusive (esse conceito também nos ajuda a compreender como o processo de socialização é permeado pelas desigualdades sociais). Tudo o que nos constitui como indivíduos. Mas habitus, para Bordieu, é uma tendência provável, não um determinismo inelutável. Isso nos leva de volta à subjetividade de Mead.
Pra finalizar: socialização é um conceito complexo, subjetivo, seja no determinismo durkheimiano ou estruturalismo marxista, não é algo que possamos falar sobre de forma irresponsável e sem conhecimento teórico. O processo de socialização pode sim ser ressignificado e readaptado a realidades modernas. A socialização depende não só da interiorização das estruturas objetivas (ação da sociedade), mas também da exteriorização por meio de comportamentos do indivíduo.
Se uma mulher é feminista, não significa que seu processo de socialização falhou. Assim como ser mulher trans não significa estar agarrada na socialização masculina que lhe foi imposta em sua infância. Subjetividades permeiam nossa existência e construímos nossa identidade ao modo que respondemos aos estímulos do meio. Isso é o processo de socialização. E isso não falha.
Por Bia Pastorello
Imagem destacada: daqui
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