Halloween e as bruxas de Salem
Halloween nos EUA é aquela coisa: tem vampiro no metrô, Harry Potter na fila do café e morto-vivo atravessando a rua. O pessoal veste a fantasia mesmo…
Esse ano escolhi me vestir de bruxa. Para além do sagrado feminino que se esconde no arquétipo, minha escolha se deu em razão da história das bruxas de Salem. Faz bem pouco tempo que aprendi detalhes sobre o que aconteceu nessa cidadezinha que fica tão perto da minha casa, e como a história é um misto de ignorância e injustiça, achei que valia a pena recontá-la. É coisa simples, que seria uma brincadeira de adolescentes não fosse a intolerância religiosa na época.
Foi assim: uma escrava sentou-se no meio da floresta junto com algumas meninas e começou a falar sobre a sua religião, de origem africana. Mas lembre-se: estamos falando de um mundo totalmente dominado por homens brancos, de meia idade, heteros, cristãos e, logo, “de bem”. Ir contra o ensinamento do status dominante era impensável, inaceitável e condenável.
Enquanto a escrava contava detalhes do vodu, e ensinava o que fazer para conseguir um bom casamento, eis que surge no meio da mata um homem influente na cidade. As meninas entram em pânico e saem correndo, fugidas. Duas delas, no entanto, paralisam. O medo foi tamanho que elas entraram num estado de histeria pra o qual só muitos anos depois Freud conseguiria dar um viés científico.
Levadas para casa, permaneceram em transe, até que a família chamou o médico. O diagnóstico foi dado prontamente: estavam enfeitiçadas. Tinha bruxa solta na cidade.
E é aqui que começam as “tretas” da história. Vai vendo: uma das meninas que estava participando do evento era apaixonada por um homem casado, com quem teve um romance. O rapaz, no entanto, resolveu terminar com ela e voltar para a esposa. A mocinha, que era bela, nada recatada, mas do lar, se enfureceu. Com a confusão, viu a chance de afastar sua rival e reconquistar seu amado, de modo que foi a primeira a concordar com o diagnóstico dado pelo médico e, claro, apontar o dedo para a esposa, que até então só tinha cometido o crime de ter sido traída.
Pronto. A essa afirmação seguiu-se uma onda de perseguição a diversas mulheres da comunidade. Não escapou ninguém: a curandeira, a parteira, a vozinha que fazia chá… Todas deviam tem ligações com o capeta, claro. Muito óbvio. Vinte mulheres foram queimadas em praça pública depois de um julgamento altamente tendencioso. O medo inflingido na população foi tanto, que a história ganhou contornos inimagináveis, atravessou o Atlântico e se espalhou para a Europa.
Anos depois, ao reverem o caso, a inocência dessas pessoas ficou evidente. Tarde demais: a injustiça já tinha feito suas vítimas. Embora o governo de Massachusetts tenha pedido perdão às famílias, Salem tornou-se a terra das bruxas e, hoje, é um dos destinos turísticos mais cobiçados na época do Halloween.
Eu não sei você, mas essa história me parece muito com o que a gente anda vendo pelo mundo. São quase 350 anos de diferença, mas a intolerância segue vitimando mentes, almas e corações. Que nesse dia das bruxas possamos refletir sobre o real, o imaginário e sobre como o conservadorismo pode ser nefasto. Sigamos com mais ciência, mais clareza, mais conhecimento e menos ficção.
Por Carol Campos
Imagem destacada: still do filme As Bruxas de Salém
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