Internet e o Feminismo Belicoso 

O feminismo de internet está bem difícil nestes últimos dias. Como parece ser o caso com muita frequência, em assuntos polêmicos muito rapidamente se vê cada uma puxar a brasa para a sua sardinha. Ainda que, ao fazerem isso, exponham preconceitos, invalidem análises críticas, projetem o que bem entendem, caguem regras, silenciem.

O caso Chimamanda Ngozi Adichie é um bom exemplo. A fala da autora nigeriana sobre mulheres trans foi pontual, mas também bastante limitada e limitante. Ela mesma fez uma nota esclarecedora, e o que analiso aqui não foi o que ela disse, mas as interpretações que diversos grupos dentro do feminismo fizeram de sua fala.

Algumas simplesmente taxaram Chimamanda de transfóbica. Outras usaram sua fala para justificar transfobia. Outras anularam críticas antitransfobia derivadas de sua fala. Outras usaram falas transfóbicas para justificar racismo. Muitas ainda seguem usando lugar de fala para silenciar qualquer pessoa…

Em outros espaços e com outros objetos também se percebe certos moralismos quanto a autoimagem e sexualidade. Alguns discursos simplesmente ignoram o fato de que sim, mulheres diferentes se empoderam com coisas distintas, ainda que não sejam maioria, ou que fenômenos sejam resinificado por alguns estratos sociais em favor do patriarcado de alguma maneira.

O feminismo de internet por vezes se parece mais com uma batalha, seja entre quem tem o melhor (pseudo-)discurso ou quem faz a melhor (pseudo-)interpretação. Quando o poder das nossas palavras se vira contra nós mesmas, o feminismo vira um campo de batalha agressivo e silenciador, chato e contraproducente. Expostos ficam os limites dos próprios feminismos, de dialogarem entre si, de coexistirem.

Nessa nossa querida sociedade todo mundo se fode. Mas a gente segue atacando umas às outras e disputando espaços entre nós mesmas. Até os homens perdem com o patriarcado – e que não caiam de pau em cima de mim por isso, mas se o patriarcado privilegia homens, ele também os prejudica. Longe de mim dizer que lutar pelos homens seja uma prioridade das mulheres, mas quando negamos as estruturas que moldam nossa sociedade e como todos são afetados por ela, todos perdemos.

Longe de mim também querer dizer como cada uma deve lutar sua luta (e cada uma deve mesmo lutar a sua luta), mas a gente deveria parar de lutar entre nós mesmas. Deveria querer parar de “lacrar”com discursos perfeitos. Parar de competir por qual luta é a mais importante. Parar de silenciar o que as outras tem a adicionar.

O feminismo não existe para salvar mulheres. Ele existe para dar fim ao patriarcado.

Devemos lutar juntas, sem anular uma à outra. Independentemente de termos nascido ou nos tornado, de sermos branca ou negras, com ou sem dinheiro, da periferia ou do asfalto, uma luta não deve anular a outra.

Enquanto discursamos, seguimos morrendo, seguem nos aniquilando.

Por Michele Pinha
Imagem destacada: Pinterest

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