A legalização do aborto é autonomia e domínio dos nossos corpos

Eu defendo a legalização do aborto. É autonomia e domínio dos nossos corpos. Certamente, se homens engravidassem o aborto seria legalizado. Permitir o aborto por lei e garantido pelo sistema de saúde não será definir aborto como método contraceptivo. Fazer isto, devera acarretar a responsabilidade da sociedade em garantir os direitos sexuais e reprodutivos de modo integral. Garantir que meninas e meninos conversem e saibam sobre sua sexualidade. Legalizar o aborto não significa torna-lo obrigatório. Quem não quiser fazer, não fará. Mas quem não quiser ser mãe, não será obrigada a isso. Maternidade não pode ser castigo nem obrigação. Maternidade tem que ser escolha para que seja realmente bom.

Defender legalização do aborto não significa, necessariamente, ser a favor do aborto. Significa não impor minhas crenças, o que eu quero para a minha vida, à vida de outra mulher. Significa garantir o direito de escolha para as mulheres. Mulheres estas que já estão vivas, que não podem ser obrigadas à maternidade. Maternidade tem que ser uma escolha, para que você se doe de verdade, porque é algo sem volta, não é? E algo que exige doação desmedida não pode ser imposto à ninguém.

Alguns argumentos que incomodam, apesar da boa intenção.

Ligar a legalização do aborto ao fato de garantir que não tenha “meninos de rua”. Isso é eugenia. “Meninos de rua” são meninos NEGROS. E o fato de estarem na rua não significa necessariamente que mulheres, sua mães, não o desejaram. Mas pode significar uma sociedade que oprime aquela mulher ao limite da perda da dignidade, à falta de oportunidades. Mulher rica também aborta. Só que pode pagar. Mulher rica também pode não querer ter filhos como uma opção. Não é só mulher pobre que vai abortar “pra não ter menino de rua por aí depois”. Parem de simplificar questões sócioraciais tão complexas.

Comparar aborto a abandono paterno. Gente, defender legalização do aborto é falar sobre células aglutinadas. Envolve limite de tempo permitido para o procedimento, envolve garantir que uma mulher, vida constituída, não morra. NÃO é uma vida sendo abandonada. Já o abandono paterno é uma vida constituída abandonada. Um ser humano pensante e não um aglutinado de células. Abandono paterno envolve mais uma chave machista que não impõe aos homens responsabilidades, muito menos discutir a paternidade e como ela, assim como a maternidade, são construções sociais. Abandonar filho é abandonar GENTE VIVA. Aborto não é abandonar ninguém. Não superestimem aborto. Não subestimem a paternidade e o abandono.

Aborto legal e seguro. Pela vida das mulheres. Pelo poder sobre os nossos corpos. Eu mulher DECIDO.

E os argumentos dos homens?

Homem que fala de métodos contraceptivos para ser contra a legalização do aborto é aquele mesmo homem que “nunca lembra” de comprar camisinha? É aquele tipo de homem que pede pra “gozar dentro” e “só um pouquinho”? É aquele tipo de homem que pede pra “colocar só a cabecinha”? É aquele tipo de homem que fala que “se incomoda com a camisinha”? É aquele tipo de homem que goza dentro e não avisa, fala que “esqueceu”, mesmo a mina tendo avisado que “não era pra ter ido até o fim”? É aquele tipo de homem que fala para a moça que ela não o ama de verdade porque quer usar camisinha? É aquele tipo de homem que chama mulher que anda com camisinha na bolsa de “vagabunda”? É aquele tipo de homem que nunca se perguntou por que cargas d’água ainda não existe uma pílula anticoncepcional para eles? É aquele tipo de homem que fala “se vira” quando a mina conta que está grávida? É aquele tipo de homem que fala que “não está preparado” para ser pai quando a mina fala que está grávida? É aquele tipo de homem que é contra o aborto e acha que “tem que prender”, mas que quando é a mina que ele transou que engravida fala que pode pagar pelo aborto, mesmo ela podendo ser presa e morrer?

Eu, sinceramente, não acho que eu tenha que, simplesmente, não ligar para a opinião dos homens, tendo em vista que se hoje nós morremos é porque a sociedade patriarcal e machista, da supremacia dos homens sobre as mulheres, não me permite decidir sobre o meu corpo. Ou seja, é o que homens pensam que define se eu vou morrer ou viver, se eu vou ser mãe quando quero ou não. Isto não significa igualar o poder de decisão de homens e mulheres com relação ao aborto, que fique escuro. Isto significa dialogar.

Sobre as moças contra o aborto.

Me pergunto se elas não conhecem nenhuma familiar ou amiga que tenha feito aborto. Ela acha que essa amiga é uma assassina? Que a mãe, tia, prima, irmã têm que ser presas? Que elas têm que morrer?

Você acha certo que o argumento que te faça seguir com uma gravidez seja “é o jeito” e não o seu desejo de ser mãe? Você acha certo uma criança crescer com a sua negação introjetada porque você disse que “é o jeito” para tê-la? Você não acha que tanto você quanto uma criança, que ainda virá, mas que ainda não existe até um certo período após a concepção, tem direito à felicidade e que este sentimento não pode ser imposto e artificializado? Não somos mães, nos tornamos.  É o direito de decidir que está sendo colocado. Não o “meu” como pronome possessivo, mas o da outra, do que ela irá fazer com a vida DELA.

Porque é muito fácil falar depois “quem pariu Mateus que balance”, né amoras? Tenhamos empatia. Hoje é “a outra”. Amanhã, pode ser você. E, sim, pode. Porque camisinha fura (porque nem colocar camisinha direito homem sabe) e porque pílula falha. E porque se você escolhe o celibato, nem todo mundo deve fazê-lo.

Minha vida, meus direitos. Eu decido. Sua vida, seus direitos. Você decide.

Por Juliana Borges
Imagem destacada: Crochet Uterus

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