Como eu era antes de você… (Contém spoilers)

Ontem eu vi esse filme. Sim, eu assisto esses tipos de filmes onde a gente chora até desidratar e fica sonhando com amores perfeitos. Sofro de um romantismo incurável. E por isso mesmo gostaria de problematizar isso.

Ao meu ver um dos grandes problemas da socialização está no fato que histórias como conto de fadas, comédias românticas e novelas são usados para a educação sentimental feminina, enquanto que a educação sentimental masculina é feita basicamente por pornografia.

Então, isso gera uma baita discrepância da expectativa de ambos dentro de uma relação amorosa e sexual. Isso via de regra cria relacionamentos abusivos onde mulheres iludidas por contos de amor esperam que seus homens mudem, por que acreditam que podem mudá-los com seu amor, até que se tornem os príncipes do final da história. E onde homens tratam suas mulheres como objetos, porque é assim que aprendem nos filmes pornôs, e que é amplamente validado na sociedade machista. A conversão do homem pornô no homem romântico acontece raramente, tão raramente que mal conseguimos contar nos dedos.

E por isso pergunto:

Quantas e quantas vezes nós mulheres fomos induzidas a acreditar que nós somos as únicas responsáveis pelo sucesso da relação? E o tanto que sofremos por causa disso em relações doentias, desgastadas e até mesmo violentas em nome de um amor que muitas vezes só existe na nossa imaginação.

É mais ou menos o caso do filme “Me before you” ou “Como eu era antes de você“. Antes de mais nada quero registrar que eu não li o livro, apenas assisti o filme, e por isso minhas impressões são baseadas apenas no filme.

O filme conta a história de Louisa Clark, uma garota sonhadora e romântica que após ficar desempregada na cafeteria em que trabalhou por seis anos, consegue um emprego bem remunerado para cuidar de um tetraplégico. Louisa é pobre e tem uma vida modesta (dentro da sociedade britânica, onde o filme se passa) onde ela precisa trabalhar para ajudar no orçamento de casa.

O tetraplégico, por sua vez, é um homem muito rico e refinado, no entanto muito depressivo com a sua condição atual. William Trainor, seu nome, antes de ser tetraplégico era um homem lindo, muito bem sucedido, esportista e conquistador que tinha uma vida perfeita ao seu ver, mas que por causa de um acidente de trânsito ficou tetraplégico e tornou-se a sombra de quem era.

Louisa desde sempre se sacrifica pelas outras pessoas, e por isso é vista como uma pessoa gentil e amável.

E assim a história se desenrola, Louisa comovida com a história de Will trata-o de maneira servil e amorosa tentando trazer a vontade de viver para o seu senhor. Outros pontos interessantes dessa história que valem ressaltar é o histórico de Louisa: Ela desde sempre sacrificou as vontades pelo bem das outras pessoas, o namorado dela (esqueci o nome) era um personal trainer que só pensava nele mesmo e em suas competições esportivas; a Louisa abandonou seu sonho de estudar moda para ajudar a renda da casa, porque sua irmã teve uma gravidez precoce e a família passou por problemas financeiros. Ou seja, Louisa desde sempre se sacrifica pelas outras pessoas, e por isso é vista como uma pessoa gentil e amável.

Assim, ela age da mesma forma com relação a William, e consegue mudar e muito a perspectiva dele com relação à própria vida. Os dois se envolvem amorosamente e parecem estar profundamente apaixonados. Todavia, isso não é suficiente para ele ficar com ela no final da história. E ai vem o ponto que eu acho importante e diferencial dessa história: ele a liberta de forma que ela possa viver os próprios sonhos e deixar de viver em função dos outros.

Durante o tempo em que ficam juntos, seis meses, ela devolve um pouco de alegria para a vida dele, e ele ao seu modo mostra a ela o valor da sua vida e liberdade.

Porém, como aquela ideia de se você ama, deixe ir, o filme mostra um final onde o amor transforma-se em liberdade e não em possessão.

E qual o ponto disso tudo no que eu iniciei a conversa? A Louisa é aquilo que toda garota romântica é, e pensa que com seu amor vai salvar o amado; todavia, para a sorte dela o amado tem plena consciência de suas limitações e resolve libertá-la de uma relação que seria completamente desigual para ela. E quantas vezes nos encontramos em relações assim? Quantas vezes sacrificamos quem somos em nome do outro? O caso de Louisa foi de sorte até porque o mundo não está cheio de Wills, e sim de Feras (acho o conto bem-parecido com a Bela e a Fera), e as Feras sugam os sonhos e as forças das românticas que cruzam os seus caminhos.

Quantas vezes nos encontramos em relações assim? Quantas vezes sacrificamos quem somos em nome do outro?

Não que Will seja alguém perfeito, mas dentro do contexto dos filmes de dramas românticos ele foi muito mais além do que muitos outros pares românticos. E no final do filme eu fiquei desolada, porque como eu disse, eu sou uma romântica incurável, no entanto, fiquei feliz por finalmente ver um filme do gênero onde a mulher sai livre do peso de ter que salvar o homem.

Então eu pergunto, quem você era antes do seu relacionamento atual? Quais eram seus sonhos e suas ambições? E esse teu relacionamento atual te ajuda ou te atrapalha com relação ao esses seus sonhos? Se te atrapalha, porque você permanece nisso? O que te falta para ser livre?

Por Renata Floriano
Imagem destacada: do freakpop.com.br

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